Sigrid Undset, Nobel de Literatura, 1928

Sigrid Undset: ganhou o Nobel escrevendo sobre mulheres



Olá a todas e todos, esperamos que estejam bem e animadas(os) para a nossa viagem de hoje (porque nós estamos muito!), vem com a gente?

Mais uma vez nossa viagem no tempo nos levará para um lugar muito frio! Um país conhecido pelas mitologias dos vikings e onde viveu uma mulher esplêndida, mas que teve muitas dificuldades, como boa parte de nós. Tudo bem, chega de delongas, hoje iremos para a Noruega conhecer a vida de Sigrid Undset! Apertem os cintos, se acomodem em seus lugares e vamos lá!


Sigrid Undset, 1932
Fonte: Wikimedia Commons; Licença: CC BY-SA 3.0


Sigrid Undset nasceu na Dinamarca em 20 de maio de 1882. Seu pai era um arqueólogo reconhecido internacionalmente e viajava muito pela Europa e, em uma das cidades em que permaneceu por algum tempo, conheceu sua mãe e foi lá que ela nasceu, sendo a mais velha de três irmãs. Em 1884, seu pai se mudou para a Noruega para assumir um cargo no Museum of Antiquities (Museu de Antiguidades, em tradução livre) da Universidade de Christiania (atual Oslo), e Sigrid, mesmo com apenas dois anos de idade, foi enviada à uma escola, pois seu pai queria que ela recebesse boa educação e seguisse os seus passos.

Até os 11 anos, a vida de Sigrid foi marcada pela doença do pai e por seu grande conhecimento. Durante esse tempo, ela aprendeu muito sobre arqueologia, histórias do norte da Europa e músicas folk da Escandinávia, que foram importantes influências mais adiante.

Sigrid não concordava muito com as ideias nas quais a escola em que estudava se baseava e, durante seus anos lá, permaneceu com grande resistência. Seu pai morreu em 1893 e, apesar de a escola oferecer que Sigrid e suas irmãs estudassem de graça, ela não quis. De acordo com a própria Sigrid, aquela escola foi ótima para a educação de suas duas irmãs mais novas, mas ela jamais se arrependeu de ter recusado continuar lá.

Sigrid Undset e suas irmãs Signe e Ragnhild, 1894

Fonte: Nasjonalbiblioteket; Licença: Sem restrições de direitos autorais conhecidas


Então, Sigrid foi enviada para uma outra escola em Christiania, da qual ela também não gostava muito, mas era onde se sentia mais livre e sem expectativas sobre como e quem deveria ser. Ainda no período da escola, começou a trabalhar em um escritório de uma empresa de engenharia elétrica, pois precisava de dinheiro para ajudar sua mãe e suas irmãs, e lá permaneceu durante dez anos, aprendendo coisas que não lhe interessavam muito. Houve momentos em que ela sentia que estava desperdiçando seu tempo e sua juventude. Entretanto, foi nesse período em que começou a dedicar mais tempo à sua grande paixão: a escrita!

Imaginem só: precisar trabalhar em algo que você não gosta por dez anos! Para algumas pessoas, isso pode parecer um absurdo! Algo sem sentido, afinal, por que ficar tanto tempo em um lugar que não te faz feliz, como a Sigrid fez? Mas outras pessoas também podem reconhecer que não é tão simples assim, ainda mais se você for uma mulher.

O machismo é um problema milenar e, por causa dele, as mulheres já foram impedidas legalmente de fazer muitas coisas (sugerimos que pesquisem, por exemplo, quando foi permitido o voto às mulheres no Brasil). Apesar de hoje em dia quase não existir mais essas proibições, infelizmente ainda há quem acredite que a prioridade da mulher deve ser a família, as(os) filhas(os) e os cuidados com o lar, e nesse caso o trabalho deve ficar em segundo plano.

Na época da Sigrid, ela precisou se manter em um trabalho que era um verdadeiro tormento para si porque precisava ajudar a família, uma família só feminina! E reconhecemos que no final do século XIX e começo do século XX as coisas eram ainda mais difíceis para as mulheres, então ela provavelmente não tinha muitas opções de onde trabalhar (e sim, lamentavelmente isso acontece até hoje!). Quantas pessoas vocês conhecem que trabalham em algo que não gostam muito porque precisam? Quantas delas são mulheres?


Sigrid Undset, entre 1900 - 1905

Fonte: Wikimedia Commons; Licença: CC BY-SA 3.0

  

Voltando a história! Ainda no tempo em que trabalhava no escritório, Sigrid escrevia tarde da noite, durante os finais de semanas e feriados. Nessa época, publicou dois livros: Fru Marte Oulie, em 1907, e Den lykkelige alder (The Happy Age), em 1908. Em especial, o livro Fru Marte Oulie escandalizou as(os) leitoras(es) logo nas primeiras linhas: “eu tenho sido infiel ao meu marido” (em tradução livre), sendo uma frase dita pela personagem principal da narrativa. A princípio, o livro foi recusado, mas depois da intervenção de um escritor conhecido da época a favor de Sigrid, a editora aceitou publicá-lo. Somos só nós ou alguém mais está sentindo o preconceito no ar?

 

Pintura de Sigrid feita por Anders C. Svarstad, 1911

 Fonte: Wikimedia Commons; Licença: Domínio público

 

Após isso, e com o sucesso que os livros começaram a fazer, Sigrid recebeu uma bolsa como escritora, largou o trabalho do qual não gostava e foi viajar pela Europa. Em 1912, na Itália, conheceu Anders C. Svarstad, um pintor norueguês, com quem se casou e teve uma filha e dois filhos. Foram momentos difíceis na vida de Sigrid, tendo que cuidar de seu primeiro filho, sua filha, que era deficiente, e mais três filhos do primeiro casamento de Anders, além de todos os afazeres domésticos. Com isso, ela escrevia somente tarde da noite, quando todas e todos na casa já estavam dormindo. Nesse período, finalizou sua última narrativa realista e algumas histórias curtas, além de começar a escrever sobre um dos temas mais polêmicos da época (e até hoje): emancipação feminina, incluindo questões éticas e morais. Então, em 1919, o casamento terminou durante a terceira gravidez de Sigrid.

Depois de muitas dificuldades e mudanças de cidade, Sigrid Undset, sua filha e seus dois filhos passaram a viver em uma casa grande em Lillehammer, com uma linda vista, onde ela finalmente poderia escrever com tranquilidade.


Sigrid Undset com seu filho Anders Svarstad (1914 – 1915).

Fonte: Wikimedia Commons; Licença: CC BY-SA 4.0


Com relação à obra de Sigrid, seus primeiros manuscritos tratavam sobre a posição da mulher na sociedade contemporânea dentro do contexto da classe média. Livros como Splinten av troldspeilet (1917; Images in a Mirror) e Jenny (1911) falam sobre essa temática. Imaginem: uma mulher no início do século XX falando sobre mulheres do século XX? Em um contexto muito misógino, consideramos que Sigrid foi transgressora e revolucionária com sua escrita!

Mais adiante, ela resolveu voltar no tempo e escrever sobre mulheres na Idade Média! Incrível, não é mesmo? E após o nascimento de seu terceiro filho e ela estar naquela casa tranquila onde podia se dedicar a escrita completamente, então Sigrid escreveu a trilogia que é considerada a sua principal obra e a fez ser a vencedora do Nobel anos depois: Kristin Lavransdatter (1920-1922) – sendo os três volumes Kransen (A coroa), Husfrue (A esposa) e Korset (A cruz). Na obra modernista, Sigrid trata a vida durante a Idade Média na Escandinávia, conta a história de Kristin, mostrando seu crescimento e como ela se tornou uma mulher forte. Essa trilogia foi um verdadeiro best-seller na época e até hoje continua fazendo sucesso, estando traduzida em vários idiomas. Ainda contando histórias contextualizadas na Idade Média, Sigrid publicou a sequência Olav Audunssøn i Hestviken (1925; The Master of Hestviken) e Olav Audunssen og hans børn (1927; Olav Audunssøn and his Children), em que trata sobre suas preocupações com relação aos problemas religiosos.

Sigrid Undset, 1923

Fonte: Wikimedia Commons; Licença: Domínio Público


Em 1924, Sigrid se converteu ao Catolicismo e, a partir de então, passou a se dedicar à escrita de obras religiosas.

Sigrid Undset recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1928, “principalmente por suas descrições poderosas sobre a vida no Norte durante a Idade Média” (THE NOBEL PRIZE, c2020).

Durante a Segunda Guerra Mundial, Sigrid decidiu deixar a Noruega durante a invasão nazista, em 1940, e foi viver exilada nos Estados Unidos da América, onde permaneceu apoiando a resistência contra o regime nazista. Sigrid demonstrava uma grande oposição à Hitler e ao regime nazista desde a década de 1930 e, dessa forma, seus livros permaneceram banidos na Alemanha por certo tempo.

Após o término da guerra, ela retornou ao seu país e faleceu em 10 de junho de 1949, na Noruega.

Para finalizarmos, gostaríamos de trazer as palavras de Gidske Anderson, autora da biografia de Sigrid Undset: “nenhum dos livros de Sigrid Undset deixa os leitores despreocupados. Ela é uma grande contadora de histórias, com um conhecimento profundo e realista sobre os labirintos da mente humana – em todos os tempos e em todos os lugares. Com sua expertise literária e histórica, adquirida em primeira mão, seu profundo conhecimento sobre a natureza e seu entendimento sobre os signos da natureza para todas e todos nós, Sigrid Undset possui enormes riquezas, emocionais e intelectuais, para explorar”[i] (tradução livre).

E então, o que acharam? Sigrid foi uma mulher incrível que escreveu também sobre mulheres incríveis! Esperamos que tenham gostado da nossa viagem de hoje!



Abraços apertados à distância, cuidem-se e até a próxima!

 

Por Gabriela Ferreira e Glaucia Pantano

 

Um pouco mais sobre Sigrid Undset

 ANDERSON, Gidske. Sigrid Undset: Et liv. Gyldendal, 2003.

 ANDERSON, Gidske. Sigrid Undset. Disponível em: <http://www.mnc.net/norway/SigUnd.htm>. Acesso em: 30 jul. 20.

 

Referências

ANDERSON, Gidske. Sigrid Undset. Disponível em: <http://www.mnc.net/norway/SigUnd.htm>. Acesso em: 30 jul. 20.

ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA. Sigrid Undset, 2020. Disponível em: <https://www.britannica.com/biography/Sigrid-Undset>. Acesso em: 29 jul. 20.

THE NOBEL PIZE. Sigrid Undset Biographical, c2020. Disponível em: <https://www.nobelprize.org/prizes/literature/1928/undset/biographical/>. Acesso em: 29 jul. 20.

THE NOBEL PRIZE. The Nobel Prize in Literature 1928, c2020. Disponível em: <https://www.nobelprize.org/prizes/literature/1928/summary/>. Acesso em: 29 jul. 20.

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sigrid_Undset_OB.RP18176b.jpg

 https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sigrid_Undset_OB.NW1297.jpg

https://www.flickr.com/photos/national_library_of_norway/6943186245/in/photostream/ https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Anders_svarstad_Sigrid_Undset_1911.jpg

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sigrid_Undset_og_Anders_Svarstad_OMu.F23595a.jpg

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Sigrid_Undset_p%C3%A5_Bjerkeb%C3%A6k.jpg

 

[i] Texto original: None of Sigrid Undset's books leaves the reader unconcerned. She is a great story-teller, with a profound and realistic knowledge of the labyrinths of the human mind - at all times and in all places. With her literary and historical expertise, acquired first-hand, her thorough knowledge of nature and her understanding of its significance for all of us, Sigrid Undset has enormous riches, emotional and intellectual, to draw on.

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