Irène Joliot-Curie, Nobel de Química, 1935

Irène Joliot-Curie foi uma parisiense nascida em 1897. Se esse sobrenome te soa familiar, não é por acaso: seus pais eram Marie Curie e Pierre Curie, ambos ganhadores do prêmio Nobel de física pela descoberta radioatividade em 1903! Inclusive, já falamos sobre a história de Marie Curie aqui no blog, pelos dois prêmios Nobel recebidos, vale a pena conferir caso não o tenha feito ainda.



Não há dúvidas de que um dos maiores legados que Marie Curie e Pierre Curie deixaram para a humanidade, além de todas as suas pesquisas e atuações no campo da Ciência, foi Irène Joliot-Curie, filha mais velha da primeira mulher da história a ser contemplada com o Nobel da Ciência, num tempo em que o campo científico era um ambiente dominado e controlado apenas por homens. Marie era mulher, era mãe, e foi aquela que teve a ousadia de quebrar padrões e fazer estremecer as relações de poder na Ciência, afinal, foi aquela que impôs sua presença nesse meio, mostrando na prática que uma mulher pode fazer Ciência tão bem quanto um homem. Além disso, há premiações do Nobel concedidos a pais e filhos, entretanto este é o único caso no qual uma mãe e uma filha foram laureadas com tal feito! Marie Curie não só foi a única mulher a ganhar 2 prêmios, mas foi a única que teve uma filha que também ganhou o Nobel.

Embora ainda hoje o caminho da Ciência seja cheio de percalços a serem enfrentados por aquelas que desejam fazê-lo, Irène, assim como a mãe, provou que as mulheres podem chegar lá! E elas chegaram em tempos em que haviam muito mais obstáculos às mulheres.

Não é de se surpreender que rodeada de figuras tão inspiradoras, como seus próprios pais e outros tantos cientistas que deixaram seus nomes na História, Irène Curie seria instigada a seguir carreira científica. E assim o fez! Embora não haja dúvidas de que enfrentou, assim com a mãe, preconceitos e discriminações por ser mulher numa sociedade em que o preconceito em relação às mulheres estava profundamente enraizado, mas seguiu em frente, deixou seu nome marcado na história da Ciência e na história de luta das mulheres. Suas histórias de vida nos servem de exemplo de dedicação, luta e perseverança.

Nesse texto, iremos desbravar um pouco da trajetória que levou a sua conquista, juntamente com seu marido Frédéric Joliot-Curie, do prêmio Nobel de Química, em 1935.


Irène Joliot-Curie 

Fonte: rosefirerising; Licença: CC BY-NC-ND 2.0


A nossa protagonista de hoje, Irène Joliot-Curie, possuía enorme apreço pela matemática ainda quando criança. Sua mãe, já muito conhecida e reconhecida no meio científico, inaugurou “A cooperativa”, que consistia em um sistema de aprendizagem no qual vários cientistas franceses ensinavam os filhos de seus colegas nas áreas em que tinham maior domínio. Essa alternativa ao sistema formal de ensino abrangia o aprendizado básico científico, aula de idiomas e conhecimentos de auto-expressão. Após 2 anos, porém, Irenè entrou no Collège Sévigné para a educação formal.

Em 1914, Irène ingressou na faculdade de Ciência da Universidade de Paris. Entretanto, com a deflagração da primeira guerra mundial, foi obrigada a suspender seus estudos. Com isso, ao fazer 18 anos, juntou-se a mãe, que atuava como enfermeira e operadora de máquinas de raio-x, tecnologia que foi projetada pelo casal Curie e utilizada em hospitais  gerenciados por Marie. Esses equipamentos radioativos eram utilizados para encontrar fragmentos de projéteis nos corpos de soldados feridos durante as batalhas. Juntas elas ajudaram a salvar a vida de milhares de soldados e aliviaram o sofrimento de incontáveis famílias. 


Marie Curie e suas filhas Eve e Irène.

Fonte: rosefirerising; Licença: CC BY-NC-ND 2.0


Ao fim da guerra, Irène retomou os estudos nas áreas da matemática, física e química no Instituto Curie. Este local foi fundado por seus pais em 1914, mas não pôde dar início às suas atividades devido ao início da Primeira Guerra Mundial. A área em que Irène dedicou seu doutorado era relacionada ao elemento químico descoberto por seus pais, o polônio, mais precisamente como se dava a sua emissão de raios alfa.

Em 1925, o laboratório de pesquisa da doutoranda recebeu um novo assistente, Frédéric Joliot. Formado em engenharia química, o estudante, que ganhou a bolsa de estudos após completar o serviço militar, recebeu a tutoria de Irène para aprender técnicas de laboratório e de pesquisa. Percebendo muitas afinidades em comum, Frèdèric e Irène logo se tornaram um casal, vindo a se casar um ano depois, em 1926. A união dos dois gerou futuramente dois filhos, Hélène, em 1927, e Pierre, em 1932.


O casal Irène e Frèdèric Joliot-Curie no laboratório

Fonte: rosefirerising; Licença: CC BY-NC-ND 2.0


Em 1928, o casal de pesquisadores se uniram para investigar o núcleo atômico. Uma de suas experiências consistia em bombardear elementos químicos com as partículas alfa liberadas pelo polônio. Como resultado, eles obtiveram isótopos radioativos de nitrogênio, fósforo e alumínio, que originalmente são estáveis. Isso porque, quando esses átomos instáveis se dissociavam após o bombardeio, eles produziam nêutrons e pósitrons, revelando, assim, a criação de isótopos radioativos de elementos naturais.

O desenvolvimento desses materiais radioativos permitiu elevar a medicina da época em um patamar nunca antes visto: era possível agora analisar alterações químicas e mudanças fisiológicas a partir da ação de radioisótopos produzidos de forma barata e satisfatória. Os isótopos radioativos produzidos artificialmente, que foram revelados à Academia de Ciências em 1934, foram úteis para acompanhar alterações químicas e processos fisiológicos, como a absorção de radioiodo pela glândula tireóide, em pesquisas biomédicas e também para o tratamento de câncer. O trabalho realizado pelo casal ofereceu a base técnica para a fissão nuclear de urânio, posteriormente desenvolvida por Otto Hahn, Lise Meitner e Fritz Strassman.

Graças a esse feito histórico da síntese de novos elementos radioativos, Irène Joliot-Curie e Frédéric Joliot-Curie foram laureados conjuntamente com o prêmio Nobel de Química, em 1935. A premiação ocorreu um ano após Marie Curie falecer devido uma leucemia gerada pela frequente exposição à radiação. Este Nobel fez da família Curie a com mais vencedores da premiação até os dias de hoje, sendo que Marie Curie foi duas vezes agraciada com tal feito. 


Irène Curie e sua mãe Marie Curie 

Fonte: rosefirerising; Licença: CC BY-NC-ND 2.0


Após o reconhecimento internacional, Irène foi convidada a dar aulas na Faculdade de Ciência de Sorbonne. Atuou também como diretora do Instituto do Rádio, fundado por sua mãe, em 1946 e como comissária de energia atômica entre 1946 e 1951. Em 1946, houve uma explosão de uma cápsula selada de polônio no laboratório em que a pesquisadora trabalhava. Este fato somado aos anos de exposição à radiação, algo que trouxe inúmeros benefícios à humanidade, infelizmente a levou ao desenvolvimento de uma leucemia. Irène Joliot-Curie faleceu devido ao câncer com 58 anos, em 1956.

Uma vida dedicada à ciência!

 

A VIDA FORA DOS LABORATÓRIOS

O casal Joliot-Curie decidiu manter os dois sobrenomes após o casamento. A união deles gerou dois filhos, Hélène, em 1927, e Pierre, em 1932. Hélène Langevin-Joliot tornou-se física nuclear e professora da Universidade de Paris e Pierre Joliot formou-se bioquímico, trabalhando no Centre National de la Recherche Scientifique.

Na questão política, Irène e Frédéric se opunham veementemente aos ideais fascistas da época. Afiliaram-se ao partido socialista, em 1934, e fizeram parte do Comitê de Vigilância dos Intelectuais Antifascistas, em 1935. Estiveram ao lado dos republicanos na Guerra Civil Espanhola. Irène trabalhou também no Conselho pela Paz Mundial.

Em 1936, aos 39 anos de idade, num período no qual as mulheres eram impedidas de exercer o direito ao voto na França, ela aceitou o cargo de Subsecretária de Estado da Investigação Científica apenas para demonstrar que as mulheres podem exercer cargos do Estado, sendo uma de apenas três mulheres a participarem de um governo pela primeira vez. 

Como se já não bastasse todas essas ações científicas, sociais e políticas citadas, Irène se dedicou ao movimento feminista sufragista. Ela trabalhou na educação de mulheres e trabalhou no Comitê Nacional da União das Mulheres Francesas. Uma mulher multifacetada e engajada!

 

Por Alana D’Ornelas, Jessica Jamal e Clarice D. B. Amaral


Infográfico: Jéssica Jamal; @mulheresnasciências.ufpr


PARA CONHECER UM POUCO MAIS 

     A história de Irène e da família Curie é realmente inspiradora! Após conhecer um pouco das suas trajetórias, nesse e em outros dois textos já publicados aqui no blog sobre Marie, foi possível ver o quanto a família Curie era à frente de seu tempo. A contribuição científica foi tão grande, que há um museu dedicado exclusivamente à família. O Museu Curie (Musée Curie) fica em Paris, onde funcionava o Instituto do Rádio, fundado por Marie Curie. Ele conta com um acervo de materiais pessoais e de pesquisa de Marie Curie, Pierre Curie, Irène Joliot-Curie e Frédéric Joliot-Curie. O mais legal é que podemos visitá-lo sem sair de casa: o museu tem uma página virtual que pode ser acessada aqui.

    Nesse vídeo do youtube, Hélène Langevin-Joliot e o historiador Spencer Weart contam um pouco sobre a parceria do casal Joliot-Curie na ciência. Ele está disponível apenas com legendas em inglês, mas vale a pena conferir mais sobre o casal sob a ótica da própria filha deles! 

    A Conferência Joliot-Curie foi criada homenageando o ilustre casal com a finalidade de promover a diversidade, a cultura de trabalho inclusiva, a progressão de carreira de jovens cientistas, especialmente para mulheres e grupos minoritários. Legal, né? Tudo isso motivado ao fato de que os Joliot-Curie se importavam muito com as vertentes sociais de sua época, como quando se opuseram veementemente ao fascismo em ascensão no final da década de 30. Você pode conferir mais sobre esse evento neste site.


REFERÊNCIAS

Mulheres que mudaram a engenheria e a ciência: Irène Joliot-Curie. Engenharia 360. Disponível em: https://engenharia360.com/mulheres-ciencia-irene-joliot-curie/. Acesso em: 2 ago. 2020.

Irène Joliot-Curie. Royal Society of Chemistry. Disponível em: http://www.rsc.org/diversity/175-faces/all-faces/irene-joliot-curie/. Acesso em 2 ago. 2020.

Irène Joliot-Curie. Biografia. NobelPrize. Disponível em: https://www.nobelprize.org/prizes/chemistry/1935/joliot-curie/biographical/. Acesso em: 15 ago. 2020.

Irène Joliot-Curie. Wikipédia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ir%C3%A8ne_Joliot-Curie. Acesso em 2 ago. 2020.

Marie Curie. Mundo Educação. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.com.br/quimica/marie-curie.htm. Acesso em: 2 ago 2020.

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