- Gerar link
- X
- Outros aplicativos
- Gerar link
- X
- Outros aplicativos
Barbara McClintock e seu salto para o Nobel
Olá a todas e todos, tudo bem com vocês? Nós estamos
ótimas e viemos convidá-las e convidá-los para mais uma viagem no tempo, para
conhecer uma cientista que teve uma grande contribuição na área da genética. Mas
antes, uma pergunta: vocês gostam de pipoca, pamonha, milho cozido ou canjica?
Então vem com a gente conhecer uma pessoa muito especial e que também adorava
milho!
Barbara McClintock nasceu em 16 de junho de 1902, na
cidade de Hartford, Connecticut, nos Estados Unidos da América (EUA), sendo a
terceira filha do casal. Nessa época, assim como ela, os estudos no campo da genética
também davam seus primeiros passos. Desde criança, Barbara era muito curiosa e
independente, demonstrando seu interesse pelas Ciências logo cedo. Após
finalizar a escola secundária (que seria o nosso Ensino Médio), ela resolveu
que queria ingressar na Universidade, mas não foi tão simples assim.
Barbara McClintock com sua família, da esquerda para a
direita: Mignon, Malcolm Rider "Tom", Barbara, Marjorie e Sara (ao
piano)
Fonte: United States National Library of Medicine;
Licença: Não puderam ser determinados – Liberada
Não encontramos muitos relatos sobre suas relações
familiares, mas algo que merece nossa atenção é a relação de Barbara com sua
mãe, que era professora de piano. Ao manifestar interesse em iniciar o Ensino
Superior, sua mãe se opôs e tentou impedi-la, pois acreditava que tal formação
poderia atrapalhá-la a se casar no futuro. Assim como nós, talvez vocês achem
isso um absurdo! Mas, infelizmente, é uma coisa que ainda acontece, mesmo
depois de cem anos. Muitas vezes, as mulheres são desencorajadas a se dedicarem
aos estudos ou às suas profissões por pessoas que acreditam que o lugar de
mulher é na cozinha, em casa, cuidando da família. Porém, não aqui nesse blog, pois
pensamos diferente!
Lugar de mulher é onde ela quiser! (Inclusive nas
Ciências!)
Continuando... apesar dos desentendimentos com a mãe,
Barbara McClintock teve o apoio de seu pai, que era médico, e se matriculou na
Faculdade de Agricultura da Universidade de Cornell, em 1919.
Durante a graduação, Barbara iniciou suas pesquisas em
uma temática que levaria para a vida toda: a análise dos cromossomos do milho.
Nesse período, participou de uma disciplina de genética, a convite do doutor C.
B. Hutchison, professor da Universidade de Cornell, que já havia notado o
interesse dela pelo assunto algum tempo antes. De acordo com ela mesma, poucas
e poucos estudantes se interessavam por essa disciplina, sendo que a maioria
optava pela agricultura como profissão. Genética não era uma temática muito aceita
naquela época, havendo relutância não apenas entre as(os) alunas(os), mas
também entre cientistas da Biologia.
Ao final do curso, em 1922, o doutor Hutchison, ao
notar o crescente interesse da Barbara pela área, convidou-a para participar de
uma segunda disciplina de genética da Universidade de Cornell. Esta era ministrada
apenas para as pessoas já graduadas, o que não era o caso de Barbara, e ela
aceitou o convite com grandes expectativas. Vale ressaltar que a graduação em genética
era ofertada apenas pelo departamento de Melhoramento Vegetal, porém esse não
aceitava mulheres como alunas de graduação, um absurdo, não acham? Mas Barbara
não se deixou desanimar e, então, ela se registrou no departamento de Botânica
na área de citologia, com formação secundária em genética e zoologia.
Dessa forma, por causa do seu interesse em citologia, Barbara tornou-se fascinada pelo estudo dos cromossomos. Sendo assim, formou-se bacharela em 1923 e, em seguida, não teve dúvidas que gostaria de continuar estudando cromossomos e suas expressões e conteúdos genéticos na pós-graduação. Barbara fascinou-se com a ideia de desenvolver estudos sobre citogenética e fatores hereditários. No período do mestrado, ela iniciou uma pesquisa que tinha como objetivo identificar os cromossomos do milho, obtendo o título de mestra dois anos depois.
Barbara McClintock
Fonte: Smithsonian Institution; Licença: Sem restrições de direitos autorais conhecidas
Mais adiante, aos 25 anos, Barbara McClintock finalizou
o doutorado na Universidade de Cornell, em 1927, recebendo o título de doutora
especializada nas áreas de citologia, genética e zoologia. Após isso, deu
continuidade aos estudos sobre citogenética, participando de projetos de
pesquisas em equipes formadas por renomados cientistas na Universidade de
Cornell e na Universidade de Missouri, onde atuou como professora assistente
entre 1936 e 1941.
Nesse período, permaneceu dedicada à análise dos cromossomos do milho, em que utilizava técnicas de microscopia e coloração carmim, que permitiram que examinasse, identificasse e descrevesse, individualmente, os dez cromossomos da planta. Isso fez com que Barbara compreendesse e demonstrasse a importância dos telômeros, nomenclatura usada para as porções terminais dos cromossomos, para o processo da divisão celular. Ademais, ela foi a primeira pessoa a descrever a recombinação genética, também conhecida como cruzamento genético ou crossing-over, ao analisar a meiose do milho.
No ano de 1931, Barbara McClintock e sua colega,
Harriet Creighton, publicaram o artigo “A
Correlation of Cytological and Genetical Crossing-over in Zea mays,” (“Uma Correlação do
Cruzamento Cromossômico Citológico e Genético no Zea mays”, em tradução livre), um trabalho no qual afirmavam que os
cromossomos formavam a base da genética e que tratava justamente sobre o
cruzamento genético, tema do qual foi pioneira. Por causa desse e de muitos
outros experimentos e publicações na década de 1930, Barbara foi eleita vice-presidenta
da Genetics Society of America (Sociedade
de Genética da América, em tradução livre) em 1939, sociedade na qual foi
eleita presidenta mais tarde, em 1944.
Visita de Barbara ao Centro Internacional de
Agricultura Tropical, acompanhada da família Roca
Fonte: United States National Library of Medicine; Licença: Não puderam ser determinados – Liberada
Ainda no início da carreira científica, suas pesquisas
foram reconhecidas internacionalmente, sendo que, em 1933, Barbara recebeu a
bolsa Guggenheim Fellowship, para
estudar na Alemanha. Entretanto, ela precisou voltar antes do planejado para os
EUA, devido à ascensão do Regime Nazista. De volta à Universidade de Cornell, Barbara
McClintock, então, descobriu que a Universidade não iria contratar uma
professora mulher e lá permaneceu entre 1934 e 1936, mas com sua pesquisa sendo
mantida pela Fundação Rockefeller.
Uma pausa para conversarmos sobre isso. Essa não é a
primeira vez que falamos sobre cargos que foram negados às nossas queridas
cientistas simplesmente por serem mulheres. Estudiosas feministas chamam isso
de “teto de vidro”, já ouviram falar sobre? Se a resposta for não, calma que a
gente vai falar sobre isso! E se a resposta for sim, deixe um comentário ajudando
a gente na conversa!
“Teto de vidro” é um fenômeno que ocorre com as
mulheres em todas as profissões que desejam seguir. É como se existisse um teto
invisível que as impedisse que atingir determinados cargos, que ficasse
segurando-as nas posições inferiores no mercado de trabalho. Pensando na
Barbara McClintock, por exemplo, o “teto de vidro” dela não permitiu que fosse
contratada como professora na Universidade onde estudou a vida toda, mesmo ela
sendo muito qualificada para o cargo. Infelizmente, isso é muito comum ainda
hoje. Mas e você? Conhecem alguma mulher que já sofreu com o “teto de vidro”?
Voltando à nossa história! Apesar desse episódio,
Barbara felizmente foi contratada como professora na Universidade de Missouri,
onde permaneceu entre 1936 e 1941 e continuou realizando muitas pesquisas. No ano
de 1941, mudou-se para Long Island, em Nova Iorque, onde passou a trabalhar no
Laboratório Cold Spring Harbor.
Barbara McClintock com a equipe do Banbury Center, Laboratório
Cold Spring Harbor – Barbara é a terceira a partir da esquerda na primeira
fileira, toda vestida de branco
Fonte: United States National Library of Medicine;
Licença: Não puderam ser determinados – Liberada
Barbara McClintock permaneceu nesse laboratório até o
fim de sua vida profissional e, durante a década de 1940, enquanto analisava a
variação da coloração de grãos de milho, ela notou que as informações genéticas
contidas no DNA não eram estacionárias. Utilizando técnicas de microscopia, a
cientista rastreou as mudanças ocorridas na pigmentação do milho e os grandes
cromossomos da planta. Dessa maneira, isolou dois genes que denominou como
“elementos de controle”, que tinham como função regular os genes responsáveis
pela pigmentação dos grãos de milho. Durante suas observações, a pesquisadora descobriu
que tais elementos de controle podiam se mover ao longo do cromossomo e que,
além disso, essas mudanças afetavam o comportamento dos genes vizinhos. A
partir daí, Barbara McClintock sugeriu que esses elementos transponíveis eram
responsáveis por mudanças na pigmentação e outras características externas do
milho. De maneira mais técnica, temos a explicação de Jerry Carvalho Borges:
“[...] ela demonstrou que dois elementos do genoma
denominados de Dissociador (Ds) e Ativador (Ac)
podiam trocar de posição nos cromossomos do milho. Essa mudança de
posicionamento ou transposição podia ser analisada por meio de mudanças na
coloração das sementes desse vegetal. O elemento Ac controla a transposição de Ds e, quando este último move-se casualmente para outra
região, ele se liberta dessa inibição e inicia a síntese de um pigmento que
leva ao aparecimento de grãos de cores diferentes (mosaicismo) nas espigas de
milho. Posteriormente, Barbara demonstrou que esses elementos transponíveis –
ou transposons – moviam-se somente após as células serem submetidas a algum
tipo de estresse (por exemplo, quando reproduzem ou quando são irradiadas).”
Barbara com a equipe no Centro Internacional de
Agricultura Tropical – Barbara é a única mulher na fotografia, a quinta pessoa
da esquerda para a direita
Fonte: United States National Library of Medicine;
Licença: Não puderam ser determinados – Liberada
A pesquisa de Barbara mudou o conceito de genoma que
estava em voga na época: que se tratava apenas de um repositório de informações
estático. Mas seu trabalho não foi bem acolhido na comunidade científica de
imediato, que o considerava radical demais, devido ao pioneirismo, e nos
ousamos em dizer que talvez por ela ser mulher também.
As contribuições da pesquisadora em afirmar a
importância dos telômeros e com a descoberta dos elementos saltitantes foram
determinantes na área da genética, além de abrirem caminhos para uma compreensão
mais profunda dos processos que ocorrem no DNA. No entanto, por muito tempo seu
trabalho foi ignorado pela comunidade científica, fazendo com que Barbara deixasse
de publicar artigos e dar palestras (mas ela jamais deixou o laboratório!).
O reconhecimento demorou a chegar e, somente em 1983,
Barbara McClintock, aos 81 anos, foi laureada com o Prêmio Nobel de Fisiologia
ou Medicina, recebendo a honraria sozinha, pela descoberta dos elementos
genéticos móveis. Com relação à
essa demora em receber o prestígio merecido, Luzinete Simões Minella comenta:
“Entre as suas descobertas e a premiação, passaram-se
mais de 30 anos. No breve discurso proferido na solenidade da premiação,
consciente das tensões e conflitos do meio acadêmico, Barbara refere-se a esse
longo período durante o qual seu trabalho foi ‘ignorado’, ‘esquecido’,
atribuindo esse silêncio (que teria se estendido aos pesquisadores que
exploraram suas ideias) à radical originalidade das suas descobertas,
responsáveis pelo rompimento de barreiras científicas. Algo difícil de ser
assimilado nas décadas anteriores à premiação e que apenas seria superado
depois do desenvolvimento posterior de novas técnicas. Finalizando, com certa
ironia, Barbara ressaltou o lado positivo do silêncio, afirmando que, sendo
raramente procurada, pode continuar a desenvolver suas investigações sem
interrupções, com prazer e liberdade.”
Barbara McClintock discursando na Conferência do
Prêmio Nobel
Fonte: United States National Library of Medicine;
Licença: Não puderam ser determinados – Liberada
Barbara McClintock foi a primeira mulher a receber o
Prêmio de Fisiologia ou Medicina sozinha, além de ser premiada com outras
honrarias, como a Service Award, do Carnegie Institution of Washington em
1967, a National Medal of Science em 1970
e o Albert and Mary Lasker Award em
1981.
Infelizmente, Barbara faleceu aos 90 anos, no ano de
1992, em Nova Iorque. Contudo, atualmente são inegáveis o pioneirismo e a
importância de seu trabalho para as Ciências e não restam dúvidas de que ela
foi determinante para o desenvolvimento dos estudos de genética.
E então? O que acharam? Nós amamos conhecer mais uma
história incrível e inspiradora! E com certeza nunca mais iremos comer pipoca
sem lembrar da Barbara McClintock!
Abraços apertados à distância, cuidem-se e até a
próxima!
Por Gabriela Ferreira, Amanda Ribeiro da Rocha e
Glaucia Pantano
Infográfico: Amanda Ribeiro da Rocha |
Algumas curiosidades sobre Barbara
McClintock
Possuía um grande
interesse em carros, pois quando era criança gostava de observar seu tio
arrumar veículos.
Barbara gostava de
brincar de tudo, principalmente sozinha, e relatou um incidente em que um
vizinho gritou com ela para parar de brincar com brincadeiras de menino,
dizendo que era a hora dela aprender a fazer coisas de garota. Ao ouvir o
relato, a mãe de Barbara telefonou ao vizinho e firmemente disse a ele para
nunca mais falar com sua filha.
Em um breve período de
sua graduação, foi assistente de Lowell Randolph, um citologista renomado da
época, porém os dois não se davam bem e logo ela deixou o cargo. Essa
associação, por mais que ruim, gerou bons frutos no futuro para o nascimento da
citogenética do milho.
Se tornou membra da
Academia Nacional de Ciências em 1944 com apenas 42 anos, uma idade considerada
jovem para os membros da Academia, sendo a terceira mulher a ser eleita membra.
Barbara foi a primeira
mulher a receber a Medalha Nacional de Ciências.
Um pouco mais sobre Barbara
McClintock
MARAGNO,
Augusto. Barbara McClintock – O Milho e o Prêmio Nobel. USP – Ciência Web, 22 maio 2019. Disponível em: <http://usp.br/cienciaweb/2019/05/barbara-mcclintock-o-milho-e-o-premio-nobel/>. Acesso em 13 nov. 2020.
MUSEU
CIÊNCIA E VIDA. Agora é que são elas: Barbara Mcclintock, Fundação CECIERJ, 30 jun. 2020. Disponível em: <https://www.cecierj.edu.br/2020/06/30/agora-e-que-sao-elas-barbara-mcclintock/>. Acesso em 13 nov. 2020.
Referências
BORGES,
Jerry Carvalho. Uma Mulher Extraordinária. Ciência
Hoje, 1 jun. 2007. Disponível em: <https://cienciahoje.org.br/coluna/uma-mulher-extraordinaria/>. Acesso em 13 nov. 2020.
ENCLYCLOPAEDIA
BRITANNICA. Barbara McClintock, 2020.
Disponível em: <https://www.britannica.com/biography/Barbara-McClintock>. Acesso em 13 nov. 2020.
FEDEROFF, Nina V. Barbara McClintock. In: Biographical
Memoirs of National Academy of Sciences. Washington
D. C.: National Academies Press, 1995. p. 211-235.
GENERA.
Barbara McClintock e a descoberta do DNA
saltitante, c2020. Disponível em: <https://www.genera.com.br/blog/barbara-mcclintock-e-a-descoberta-do-dna-saltitante/>. Acesso em 13 nov. 2020.
MARCOLIN,
Neldson. Conhecimento aos saltos. PESQUISA
FAPESP, ed. 141, p. 8-9, 2007. Disponível em: <https://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2007/11/08-09_memoria_141.pdf>. Acesso em 13 nov. 2020.
MINELLA,
Luzinete Simões. NO TRONO DA CIÊNCIA I: MULHERES NO NOBEL DA FISIOLOGIA OU
MEDICINA (1947-1988). Cadernos de
Pesquisa, v. 47, n. 163, p. 70-93 jan./mar. 2017. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/cp/v47n163/1980-5314-cp-47-163-00070.pdf>. Acesso em 13 nov. 2020.
THE
NOBEL PRIZE. Barbara McClintock
Biographical, c2020. Disponível em: <https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1983/mcclintock/biographical/>. Acesso em 13 nov. 2020.
THE
NOBEL PRIZE. Barbara McClintock Facts,
c2020. Disponível em: <https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1983/mcclintock/facts/>. Acesso em 13 nov. 2020.
THE NOBEL PRIZE. The
Nobel Prize in Physiology or Medicine 1983. Disponível
em: <https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1983/summary/>. Acesso em 13 nov. 2020.
- Gerar link
- X
- Outros aplicativos
Comentários
Postar um comentário