MMC ENTREVISTA - Andrelissa Gorete Castanha







Andrelissa Gorete Castanha pesquisa sobre a neurobiologia do autismo na USP


Ela atua na nova unidade de um dos mais respeitados institutos do mundo, o Institut Pasteur de São Paulo

Por Leandra Francischett

A pesquisadora Andrelissa Gorete Castanha está nos Estados Unidos, onde passará alguns meses aprofundando suas pesquisas na área do autismo, de modo a estreitar laços com renomados neurocientistas na University of California of San Francisco (UCSF), graças ao doutorado sanduíche. Andrelissa completou 30 anos dia 4 de março de 2024 e já conta com uma bagagem científica de peso na Universidade de São Paulo (USP). Ela nasceu em Cuiabá (MT) e, aos 13 anos, mudou-se com os pais André e Juliane e o irmão João Paulo para Francisco Beltrão (PR), onde viveu até os 19 anos, ao ingressar na graduação. Com apenas 22 anos, mudou-se para São Paulo, onde reside há sete anos.

Andrelissa é licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná- Campus Dois Vizinhos (UTFPR-DV), entre 2013 e 2016. Durante o ano de 2017, participou como estagiária voluntária no Laboratório de Modelagens de Doenças, na USP, com foco em pesquisas na área do autismo. É mestra e, atualmente, doutoranda pelo Instituto de Ciências Biomédicas na USP, com enfoque em pesquisas sobre a neurobiologia do autismo. Além disso, atua na construção de materiais didáticos a fim de contribuir em esclarecimentos para o tema e é coautora do livro “Autismo: Manual do Professor”, em parceria com seus pais André e Juliane, lançado em 2021, pela Editora Unidos pelo Autismo.

 

Seus pais também são pesquisadores. De que forma isso contribuiu com as suas escolhas na área científica?

Acredito que o exemplo deles foi essencial para que eu encontrasse o meu caminho. Não somente por serem pesquisadores, mas sim pelo fato de eles terem sempre me incentivado a estudar, a ser curiosa, isso foi o mais importante.

 

Como surgiu seu interesse pela ciência?

Bom, eu lembro como se fosse hoje a primeira vez que eu olhei em um microscópio, na segunda série. Eu me encantei com aquele ‘pequeno’ mundo a partir desse momento. E apesar de ter mudado de ideia várias vezes, como qualquer criança ou adolescente, eu percebi que o mais fascinante era saber sobre o cérebro. E foi nesse tempo da minha adolescência que meu irmão foi diagnosticado como autista, o que permitiu que eu visse um direcionamento dentro da área da Neurociência, que eu queria seguir, e ainda permaneço atuante.

 

Quais as suas atuações no momento?

Hoje, eu posso dizer que desenvolvo meu doutorado no Instituto Pasteur de São Paulo inscrita pelo Instituto de Ciências Biomédicas na Universidade de São Paulo (ICB-USP), buscando compreender mais o papel de uma célula, chamada microglia, no cérebro autista. Essa célula é responsável por atuar como nosso sistema imunológico no cérebro. Qualquer microrganismo ou inflamação que tivermos no cérebro ela vai agir. E o que nós sabemos no caso do autismo é que existe uma neuroinflamação, ou seja, existe uma inflamação que dificulta o funcionamento do cérebro. Os próprios neurônios, bem como as outras células, por exemplo, astrócitos e microglias podem estar inflamados e prejudicar o funcionamento cerebral. Nossa ideia é entender de que forma isso acontece e como essas células atuam. Além disso, em paralelo, eu trabalho com neurônios e astrócitos derivados de pessoas autistas e realizo infecções in vitro, com o vírus SARS-CoV-2, em laboratório de nível de segurança 3 (NB3), com o objetivo de entender como a doença da COVID-19 atinge os autistas, pois de acordo com o que sabemos de muitos relatos, de pessoas neurotípicas, ou seja, não autistas, tiveram sintomas neurológicos e que no caso dos autistas eles tiveram um aumento de estereotípias. Ambos os trabalhos são realizados com o suporte da ONG Projeto A Fada do Dente e realizados no Institut Pasteur de São Paulo. Além disso, fui selecionada em um edital para doutorado sanduíche, chamado de Print-CAPES, para ficar seis meses na University of California of San Francisco (UCSF) e aprofundar as pesquisas na área do autismo com renomados neurocientistas.

 

Entre seus principais trabalhos está o livro “Autismo: Manual do Professor”, em parceria com seus pais. Quais as contribuições desta obra?

O livro “Autismo: manual do Professor” foi um manual idealizado pela nossa família com o propósito de ajudar outras famílias e, também, professores e demais educadores na compreensão do que é o autismo e de que forma cada um pode ajudar. Em relação a minha participação no livro, o objetivo proposto foi apresentar o autismo pelo ponto de vista da Ciência através da explicação de sua história, limitações nas pesquisas e, especialmente, os avanços científicos.

 

Quais os seus próximos planos?

Eu sempre brinco que sou uma pessoa completamente acadêmica, portanto, meus planos permanecem de estar no ambiente acadêmico, estudando, participando de grupos de pesquisa e talvez até estudar por determinado período fora do país, como uma forma de expandir horizontes.

 

Como você analisa a situação das mulheres nas ciências?

No ambiente científico que faço parte vejo que a maioria são mulheres e, logicamente, elas são dedicadas, inteligentes e comprometidas com o desenvolvimento científico no país. Porém, ainda é perceptível que poucos cargos importantes são ocupados por elas. Acredito que muito temos a evoluir e que o prognóstico é positivo, mas ainda levaremos tempo para passarmos por esse período de transição até o ambiente científico seja mais igualitário entre homens e mulheres.

 

Quais as suas inspirações no meio acadêmico?

Nesse momento, posso destacar duas mulheres incríveis como minhas inspirações no meio acadêmico, a doutora Patrícia Beltrão Braga e a doutora Paola Minoprio. A doutora Patrícia Beltrão Braga, em primeiro lugar, tem meu carinho por ser uma orientadora muito atenciosa e comprometida com a evolução dos alunos. Além do mais, ela tem um excepcional currículo e, como um dos exemplos disso, ela foi responsável por descobrir que a microcefalia estava relacionada com o vírus Zika e, no caso do autismo, observou que os astrócitos, células responsáveis por nutrir os neurônios estavam inflamados, prejudicando o funcionamento destes, diminuindo número e também formação das sinapses. Além disso, tenho como inspiração a doutora Paola Minoprio, que também tem um excelentíssimo currículo, especialmente nas áreas da parasitologia e imunologia. E, somado a isso, outro trabalho muito importante dela foi trazer um dos mais respeitados institutos de pesquisa no mundo para o Brasil, o Institut Pasteur de São Paulo, do qual eu tenho o privilégio de fazer parte.

 



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